artigos e ensaios - 2015 / Mariza Peirano

Edmund Leach (1910-1989)

Nossas classificações indicam a forma como procuramos organizar o mundo. Em relação à inserção dos antropólogos na disciplina, podemos distinguir duas maneiras: uma, representada pelos que se comprazem em criar rótulos para fundar ou legitimar escolas de pensamento (como foi o caso do funcionalismo, estrutural-funcionalismo, estruturalismo, etc.). Outra, pelos que se situam como elos contemporâneos e membros de linhagens, dialogando, contestando e expandindo novos horizontes. Edmund Leach foi um dos principais antropólogos do segundo tipo, em um estilo brilhante, arrojado, criativo e polêmico. Sua originalidade teórica não foi marcada pela criação ou adesão a uma escola, mas pelo diálogo incessante com a própria história da antropologia, criando novas combinações a partir dos materiais analisados. Leach criticou vigorosamente tanto antigos mestres como colegas quando considerava que suas ideias impediam sua criatividade. Mas era comum que, em outras ocasiões, recuperasse suas contribuições, indicando que nenhum antropólogo está sempre (in)correto – postura que utilizou para sua própria autoavaliação quando revisava posições que tomara antes. Sua obra pode ser vista como uma interlocução permanente, resultado da profusão de temas e materiais a que propôs investigar. Em constante oposição à ortodoxia paralisante, deixou uma marca singular, comprovando que não há limites à inquirição da antropologia ao mundo. A obra de Leach foi e continua sendo fundamental para a formação de novos antropólogos.

Edmund Ronald Leach nasceu em Lancashire, Inglaterra, em 7 de novembro de 1910, e faleceu em 6 de janeiro de 1989. Graduou-se em Matemática e Ciências Mecânicas no Clare College de Cambridge em 1932, com a distinção de First Class Degree. Após um período de quatro anos na China como funcionário de uma empresa de comércio, durante o qual viajou extensamente nas férias (incluindo uma visita aos Yami na ilha de Botel Tobago, seus “primitivos reais”), retornou à Inglaterra em 1937 e estudou Antropologia Social com Bronislaw Malinowski (cf. ensaio neste livro) e com Raymond Firth. A uma pesquisa abortada no Curdistão devido à crise de Munique (1939), seguiu-se uma viagem à Birmânia (hoje Myanmar), em 1939, para um período de pesquisa de campo que se prolongou até o fim da Segunda Guerra. Durante este tempo, tornou-se membro do Exército da Birmânia, viajando e conhecendo a região ocupada pelos Kachin no Nordeste do país. Doutorou-se na London School of Economics em 1946, onde passou a lecionar até 1953, quando retornou a Cambridge como Lecteur. Promovido a Reader, em 1972, foi nomeado para uma cátedra na universidade e, em 1966, tornou-se Provost do King’s College. Ascendendo em sua carreira, recebeu inúmeros prêmios prestigiosos na Inglaterra e nos Estados Unidos. Não se furtou a contribuir nas tarefas administrativas das instituições que prezava, inclusive ocupando altas posições acadêmicas e inserindo-se na vida pública: proferiu conferências na BBC (1967), escreveu inúmeros ensaios e incontáveis resenhas de livros, foi presidente da Association of Social Anthropologists (1966-1970) e do Royal Anthropological Institute (1971-1975), entre outras distinções e honrarias, culminando com sua elevação ao status de Cavaleiro, em 1975. Aposentou-se em 1979.. Leia na íntegra...